Um dos gêneros literários que com certeza não me entusiasmam é o gênero ficção, mais especificamente o de ficção científica. Apesar de reconhecer a impressão de assombro diante de tudo o que o desenvolvimento científico em suas diversas áreas é capaz de ainda nos trazer, em assunto de literatura não consigo deleitar-me como faria com uma obra de Machado de Assis ou mesmo Conan Doyle.
Apesar desta introdução aparentemente desfavorável, nunca deixei de incentivar a leitura de obras deste gênero, e como prova disso aqui estou escrevendo sobre o mais recente livro que acaba de ler, “A 5ª Onda: Nós Revidamos” do escritor norte-americano Rick Yancey, publicado em 2013 (YANCEY, Rick. A 5ª Onda: Nós revidamos. Ed. Fundamento, 2013, 367 pgs).
Uma ficção científica que traz o tema mais famoso na modernidade entre os romancistas deste gênero, a invasão e dominação do planeta Terra por parte de seres extraterrestres. Apesar deste tema ser muito batido neste nicho, o autor em questão tentou ser inovador naquilo que pode diante de tantas versões já produzidas do mesmo evento improvável, apesar de não impossível, ou seja, uma vista de alienígenas em nosso mundo atordoando toda a humanidade com a simples prova de existência fora deste globo azul e verde.
A história já começa em meio a invasão, ou melhor, em meio a manifestação da principal intenção destes seres alienígenas, uma vez que o autor deixa claro que em nosso mundo eles já se faziam presentes a muito tempo, como uma das primeiras etapas deste grande plano de invasão, dominação e destruição. A inovação pode ser vista talvez neste fato de como os seres alienígenas chegaram até nosso sistema solar e assim na Terra. Sempre estamos acostumados a pensar em aliens com corpos estranhos, nojentos e amedrontadores, e é isso que não se apresenta na obra de Yancey, pois estes seres desfizeram-se de seus corpos, que segundo nos vai dizer o personagem Evan, seriam até semelhantes aos nossos. Se desfizeram de seus corpos físicos quando sentiram a necessidade de procurar outro planeta para habitar, então fizeram um upload de todos os habitantes à uma grande nave espacial, a chamada Nave Mãe. Este upload em realidade, seria como através de um sistema eletrônico, sugar nossa consciência e de alguma forma toda a capacidade racional de cada um, e descarregá-las num grande banco de dados no interior da Nave Mãe. Desta forma, poderiam viajar anos pelo espaço sem as mazelas de corpos mortais. Chegando na Terra, faz-se um download em seres humanos nascidos, que em determinados anos de vida poderiam aflorar esta consciência alienígena e então começar a povoar o planeta. Claro, isto nas primeiras fases da invasão.
Citei apenas um personagem, mas outros são protagonistas, como Cassie, Sammy e Ben Parish, e é através deles que o final da 4ª onda ou fase e início da 5ª fazem desenrolar-se a trama escrita por Yancey. Deste enredo todo, pude encontrar certos elementos que povoam a consciência moderna das pessoas, cada vez mais envolvidas pela tecnologia.
Um destes elementos é a quase certeza de que poderemos um dia desmembrar nossa consciência do corpo mortal. Em uma análise mais profunda, acabamos revendo o antigo desejo de imortalidade, pois poder fazer transferência de nossa consciência com tudo o que já conhecemos e somos, parece ser um desejo que percorrerá a vida da humanidade até o fim. Ficção científica também pode nos levar a isso, alimentar ainda mais em nós a possibilidade de fingir que não somos mortais e que um dia, por nossa próprio engenhosidade poderemos vencer a morte e viver eternamente, sepultando de vez a ideia de eternidade, de alma, enfim, de Deus.
Como destaquei acima, sempre incentivo a leitura de variados gêneros, inclusive o de ficção, que nos ajuda a medir a temperatura de influência literária sobre a formação humana em nosso tempo.
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